Story | 20 Out, 2016

Brasil e Guatemala colaboram na restauração da paisagem florestal:sucesso do intercâmbio de conhecimento e experiências para as comunidades e autoridades locais das sub-bacias de Xayá-Pixcayá

Atingir restauração da paisagem florestal (RPF) em larga escala depende do engajamento e compromisso de milhares de produtores rurais e comunidades. Adicionando políticas públicas, incentivos econômicos e financeiros, boa governança, abordagem multi-setorial e multi-ator e capacitação completa a lista de fatores de sucesso. O desafio é traduzir tudo isso em realidade. Com Identificação de maneiras para superar esse desafio foi o foco do intercâmbio de conhecimento e experiências entre Brasil e Guatemala realizado em agosto de 2016 com o apoio da IUCN e Prefeitura de Extrema.

O intercâmbio é uma continuidade do 2015 learning exchange with China, Guatemala and Indonesia in Brazil, focado nas sub-bacias de Xayá-Pixcayá que abastecem aproximadamente 50% da água consumidade pelos 2 milhões de habitantes da Cidade da Guatemala. Poços artesianos são responsáveis pelos outros 50% da água necessária para a cidade.

Os principais objetivos do intercâmbio foram:

  • Apresentar aos principais atores da Guatemala um dos mais bem sucedidos exemplos de pagamento por serviço ambiental (PSA) no Brasil, o “Programa Conservador das Águas de Extrema”
  • Identificar experiências e aprendizados de Extrema que poderiam ser replicados nos municípios das sub-bacias de Xayá-Pixcayá
  • Compartilhar as experiências de restauração da paisagem florestal da Guatemala que poderiam ser adaptadas ao contexto do Brasil
  • Definir maneiras para o estabelecimento de uma colaboração formal entre as autoridades locais de Extrema e os municípios das sub-bacias de Xayá-Pixcayá. 

O intercâmbio incluiu uma série de reuniões e visitas de campo com a participação de representantes de organizações não-governamentais (ONGs), setor privado, governos (federal, departamento e municípios), universidade, técnicos e extensionistas, produtores rurais e comunidades locais. Essas reuniões foram fundamentais para conhecer o contexto e atividades e projetos sendo implementados na região. Após as mesmas a equipe chegou às seguintes observações:

  • A Guatemala tem todos os elementos para ser tornar uma referência mundial e ser um laboratório vivo de experiências e conhecimento na América Latina nos temas de conservação, manejo florestal e restauração de áreas e florestas degradadas.  A Guatemala já possui um dos programas de incentivos mais inovadores do mundo para apoiar a recuperação, reabilitação, restauração florestal, manejo florestal sustentável e proteção de florestas em escala: PROBOSQUES, o qual resultou de dois programas de incentivos executados com sucesso entre 1998-2015 (PINFOR e PINPEP). Além disso, a Guatemala assumiu um compromisso ao Bonn Challenge de recuperar 1,2 milhão de hectares de áreas e florestas degradadas nos próximos 30 anos e gerar com isso uma gama de benefícios sociais, econômicos e ambientais para o país. 
  • Boa parte do conhecimento e experiências geradas durante os primeiros 10 anos de execução do “Programa Conservador das Águas” de Extrema podem ser usadas e replicadas com sucesso nas sub-bacias de Xayá-Pixcayá. Apesar das diferenças entre as realidades de Extrema e municípios das sub-bacias de  Xayá-Pixcayá, as semelhanças entre eles são significativas.
  • As lideranças e autoridades dos municípios de Xayá-Pixcayá estão cientes da necessidade de proteger e restaurar seus recursos naturais e produzir serviços e produtos ambientais para as comunidades locais e população urbana, mas estes serviços e produtos ainda precisam ser reconhecidos e compensados. 
  • Os produtores rurais e comunidades locais que manejam e dependem dos recursos naturais são bastante carentes em termos de recursos financeiros e por isso acabam degradando os mesmos como parte da sua estratégia de subsistência. Por outro lado, eles estão prontos para proteger os recursos naturais  e restaurar áreas e florestas degradadas se receberem algum tipo de incentivo como compensação (financeiros e não-financeiros). Segundo Rogelio Caná, líder comunitário de Payá, “as comunidades de Payá estão conscientes que elas precisam cuidar das florestas para conservar água que abastece as suas casas e a municipalidade de San Juan Comalapa, mas por causa da falta de recursos financeiros e oportunidades de trabalho elas são forçadas a usarem os recursos das florestas para gerar renda e sobreviver no dia-a-dia.”
  • A participação das mulheres no processo de decisão e execução das atividades é ainda bastante restrito, mas através do apoio da Aliança Ambiental a participação das mulheres na restauração da paisagem florestal nas sub-bacias de Xayá-Pixcayá tem melhorado a cada dia.
  • O apoio dos formuladores de políticas públicas e governantes é fundamental para o sucesso de programas de PSA na Guatemala e para promover uma participação mais ativa das mulheres.
  • Ainda existe um conhecimento e reconhecimento limitado entre o papel dos provedores (produtores e comunidades) dos serviços ambientais e os recebedores (população urbana, setor privado, empresas de abastecimento de água, etc.) desses serviços.
  • Os principais atores interessados na proteção e restauração das sub-bacias de Xayá-Pixcayá estão bem organizados e mobilizados. Um exemplo é a Aliança Ambiental de Xayá-Pixcayá, a qual é composta por várias organizações, atores e setores. Conforme depoimento do Lic. Julio Ernesto Pérez, Gerente da Cervecería Centro American (Cerveza Gallo), “Como empresa privada nós reconhecemos a importância das ações que a UICN e Aliança Ambiental estão executando para restaurar as sub-bacias de Xayá-Pixcayá. Nós apoiamos a iniciativa da UICN e Aliança Ambiental de Xayá-Pixcayá porque eles têm objetivos claros e metas bem definidas, logo nós continuaremos apoiando eles para que a Cidade de Guatemala não sofra um crise hídrica no futuro próximo.”

      Photo: Carlos Rosal

Uma das importantes lições durante esse intercâmbio foi a constatação de que ainda existe uma distância entre os compromissos ambientais globais e nacionais e os responsáveis locais pela implementação dos mesmos. 

Em muitos casos os projetos são desenvolvidos sem levarem em consideração o contexto social e político local, que acabam resultando num prazo maior para atingir os resultados e impactos esperados pelos mesmos. Ao mesmo tempo, esses projetos são afetados pela falta de coordenação inter-institucional, baixa eficiência pela duplicação de esforços, desconhecimento das melhores estratégias de restauração no nível local e mudanças frequentes nas equipes das instituições que coordenam os projetos. 

Outros fatores como orçamentos incompatíveis com os objetivos e metas dos projetos, falta de um sistema de monitoramento e baixa sistematização das experiências e conhecimento, e ausência de uma gestão adaptativa para garantir os resultados de curto, médio e longo prazo são também responsáveis pelo insucesso de muitas iniciativas de restauração.

Baseado nos desafios e oportunidades identificadas durante o intercâmbio, as seguintes recomendações foram sugeridas:

  • Promover o programa PROBOSQUES como um exemplo de sucesso para potenciais financiadores e doadores internacionais e nacionais e países interessados em programas de PSA e restauração da paisagem florestal. 
  • Gerar mais evidência (empírica e científica) dos benefícios sociais, econômicos e ambientais gerados através da infraestrutura natural com o objetivo de aumentar os investimentos públicos e privados em projetos de restauração.
  • Mobilizar, fortalecer e aumentar o engajamento e união de todos atores chaves.
  • Aumentar a participação das mulheres no processo de decisão, execução das atividades e programas de incentivos e capacitação.
  • Implementar 3-4 iniciativas de PSA nas sub-bacias de Xayá-Pixcayá (p.e. comunidades locais de Tecpan e Payá) sob a liderança e coordenação da Aliança Ambiental Xayá-Pixcayá.
  • Aumentar o número de representantes do setor privado na Aliança Ambiental de Xayá-Pixcayá.

O sucesso de qualquer programa ou projeto de restauração em larga escala depende principalmente da capacidade de focar na sua execução. A Guatemala já possui um marco legal bem estruturado e capacidade técnica, faltando apenas aumentar a escala da implementação das ações e metas. “Através do exemplo do programa de PSA de Extrema”, segundo Walter Morales, Chefe da Unidade de Meio Ambiente da municipalidade de Tecpán, “nós acreditamos que está na hora de ir do planejamento para ação e avaliar as oportunidades para estabelecer um programa de pagamento por serviços ambientais nas sub-bacias de of Xayá-Pixcayá e acelelar os esforços de restauração nas mesmas.”

Através do aprendizado durante o intercâmbio e da experiência de Extrema, os participantes ficaram bastante otimistas com o sucesso da restauração em larga escala na Guatemala e no mundo.

Autores: Carlos Rosal (Coordenador de Programa, Especialistas em Recursos Hídricos, IUCN Guatemala), Miguel Calmon (Gerente Sênior, Programa Global de Florestas, IUCN) e Paulo Pereira (Secretário do Meio Ambiente, Município de Extrema, Minas Gerais, Brazil)